O sujeito andava irritado.
A questão Tostines era: estava azedo porque lia Bukowski? Ou lia Bukowski porque estava azedo?
Indignado com o mundo, via documentários chocantes para virar vegetariano, fez parte de sete abaixo-assinados do Avaaz, seguia o Twitter do Brasil Urgente e recebia fotos de cachorros maltratados no Facebook.
Era só o que chamava sua atenção naqueles dias.
Para a maioria das questões, sua resposta era uma só.
— Cara, você viu que Fulano trocou de emprego?
— Idiota...
A resposta podia ser usada em vários outros assuntos.
— O povo do RH mandou a lista de documentos que você precisa para se incluir no plano de saúde.
— Idiotas...
— Sua mãe ligou!
— Idiota...
— Seu irmãozinho fez este desenho. Está vendo? Você é o de capa. Voando e salvando as pessoas nesse prédio em chamas, depois de acertar o tiranossauro que soltava fogo. Acho que ele pensa que você é um super herói.
— É um idiota...
Para alguém irritadiço, tudo que é irritante fica turbinado.
Acordar às segundas era um inferno. Os olhos doíam com a claridade cinza do dia nublado na janela. Não queria acender a luz logo de manhã porque a conta de energia veio muito alta.
No meio da semana, reencontrou uns antigos colegas de trabalho na hora do almoço. Eram legais, mas constatou que só gostava deles na época em que trabalharam juntos. Deram um aperto de mãos e disseram frases clichês de paulistano:
— Cara! Que coincidência! Quanto tempo! Mundo pequeno, hein? Como vai Fulano? E Ciclano? Tem visto a Fulana? Ela continua gostosa? Casou? Nossa! Lembra quando a gente comeu aquele sanduíche do tuppleware sem etiqueta da geladeira? Vamos combinar um happy hour!
Small talk, uma lembrança engraçada e veio aquele silêncio constrangedor da falta de assunto. Não fazia mais questão de continuar a conversa. Despediu-se de todos e foi para a fila do buffet para montar e pesar seu prato.
No metrô, irritava-se com os apressados. Dava ombradas e estendia seu cotovelo em qualquer um que aumentasse a velocidade em ultrapassagens na boca da escada rolante.
Quanto ao trânsito, andava com seu carro a 15 km/h no momento em que ouvia uma buzinada na abertura do semáforo. Ainda fazia questão de dar pequenos trancos assim que colocava a primeira marcha.
Certa vez, parou seu Celta no meio da rua, ligou o pisca-alerta, abriu o vidro dianteiro e fez sinal de que o carro estava quebrado, apontando o polegar para baixo. Quando o enfurecido motorista do carro de trás o passava, nosso querido personagem azedo disparava o carro, cantando pneus.
Acho que estava torcendo para se meter numa briga.
Durante as aulas do MBA, ficava puto com o excesso de participação dos outros alunos.
— Esses idiotas querem mostrar que sabem tanto ou mais que o professor. Por que não param de interromper a porra da aula? — pensava e às vezes, resmungava em voz baixa.
O sujeito estava se sentindo meio mal. Cogitou fazer terapia para entender as razões existenciais de estar tão mal-humorado. Por que será que andava tão azedo?
Tinha um jantar marcado na terça-feira com uma colega do MBA. Ela tinha a mesma opinião sobre as constantes interrupções das aulas pelos idiotas que "sabiam tudo". Já tinham um assunto em comum.
O azedume do sujeito resultava em comentários sarcásticos e piadas ácidas. Seu mau-humor o tornava engraçado. Como resultado, conseguiu arrancar várias gargalhadas dela.
O encontro terminou bem.
No dia seguinte, ele acordou e sorriu para o sol. Tudo o que precisava era de uma boa trepada.
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